Na minha recente estadia em Washington tive a oportunidade de falar com o reputado investigador Richard Florida, da George Mason University. As geniais teorias de Florida sobre o desenvolvimento económico regional estão a deixar perplexos (e algo irritados também!) os mais conservadores dos economistas. Desde há muito que os estudiosos das cidades e do desenvolvimento regional procuram compreender como se podem atrair as grandes empresas a nível mundial e com isso gerar riqueza e emprego, ou seja, como criar cidades que prosperem económica e socialmente.
As teorias de Florida sobre aquilo que designa de “classe criativa”, vêm porém trazer uma visão radicalmente diferente sobre o desenvolvimento regional nos dias de hoje. E deixam uma mensagem clara para as cidades e regiões que se querem afirmar no mundo globalizado do século XXI. Os seus estudos mostram que, ao contrário do que os economistas mais clássicos sempre sustentaram sobre a atracção de investimento para o desenvolvimento, o segredo para o crescimento económico não são as empresas que se vêm estabelecer nas cidades, mas antes as pessoas que aí se fixam.
Se anteriormente eram as pessoas que se mobilizavam para onde existia emprego (e nós que o digamos com os nossos emigrantes para a França, a Alemanha e muitos outros destinos), assiste-se hoje ironicamente à deslocalização de grandes e valiosas empresas para cidades e regiões onde podem encontrar pessoas criativas e inovadoras. E exemplos não faltam: empresas como a Yahoo, a Google e a eBay, empresas altamente geradoras de riqueza, correm atrás de cidades como Boston, Massachussets, Seatle e muitas outras, onde podem encontrar os profissionais mais criativos, inovadores e, consequentemente, geradores de riqueza. Hoje, é a indústria que vai atrás do capital humano e não o contrário!
A mensagem dos apoiantes deste novo paradigma é clara: As cidades que querem vingar no século XXI não se devem preocupar tanto com a atracção de grandes empresas (porventura geradoras de trabalho pouco qualificado), mas antes de atrair pessoas com elevado capital criativo, a classe criativa. Esses sim, serão o factor-chave do progresso e do desenvolvimento económico.
É pois, este, um dos maiores desafios que se colocam à cidade de Lisboa e à região que representa. Para sobreviver, como cidade cosmopolita, desenvolvida e empreendedora no século XXI, Lisboa tem de ser capaz de atrair os talentos que constituem a classe criativa. E concorrência não falta, a começar por cidades como Berlim, Amsterdão ou Barcelona...
Torna-se por isso fundamental compreender o que procuram esses trabalhadores criativos da era do conhecimento. E mais uma vez, as respostas começaram a surgir nos estudos pioneiros de Richard Florida sobre geografia económica. A sua investigação tem demonstrado que estas pessoas criativas preferem optar por viver em locais inovadores, diversificados e tolerantes. Em sucessivos estudos onde Florida utilizou índices tão excêntricos e controversos como o “índice de bohémia” (que sintetiza o número de trabalhadores criativos como os artistas, cientistas e outros), ou o “índice de talento” (que corresponde à percentagem de pessoas com licenciatura ou acima), ou mesmo o “indicador gay” (que corresponde ao número de homossexuais assumidos numa dada comunidade), os resultados mostram de forma consistente que as cidades mais tolerantes e que conseguem atrair pessoas mais diversificadas (i.e., de origens, costumes e tradições muito diferentes) são aquelas que mais conseguem inovar e gerar riqueza nas sociedades ocidentais. É nestas cidades que a inovação emerge e se traduz numa mais valia estratégica, e talvez tenha sido por isso que Lisboa foi na época dos Descobrimentos, uma cidade próspera e cheia das variedades que chegavam de “outros mundos”.
As implicações desta nova realidade para as políticas municipais são inúmeras. Lisboa pode e deve voltar a estar no centro do mundo, a ser uma cidade cosmopolita e capaz de atrair os recursos humanos mais criativos e capazes de gerar riqueza para a região e para o país. Fomos capazes de o fazer no passado e temos de o ser também no presente. As potenciais medidas concretas são muitas: criar habitação a baixos custos para jovens de outros países e Universidades; fomentar e apoiar estágios de pessoas provindas de todos os cantos do mundo; agilizar e baixar os custos de transporte do exterior para a cidade, incluindo aeroportos, zonas portuárias e ferrovias, etc, etc.
Enfim, as medidas são virtualmente ilimitadas. A visão é uma só: Lisboa--Cidade Criativa!
Miguel Pereira Lopes
Professor Universitário no ISPA
Ex-Director do Jovem Socialista
mlopes@ispa.pt
Nota: Agradecemos o contributo do Professor Miguel Lopes, apresentando as devidas desculpas por algum desfasamento entre o envio e a publicação do mesmo.
2 comentários:
Capital intelectual e o knoledge worker... Sou grande apoiante! Aí está aquilo que esta afável nação de D. Afonso Henriques devia ter no seu horizonte...
Confesso-me grande apoiante da ideia.
Contudo não percebi: como atrair esse capital criativo para uma cidade, apenas por esta ter uma mentalidade progressista? aliás, como se mostra a mentalidade de uma cidade?
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